sábado, 30 de maio de 2009

A verdadeira crise está no homem - 2



O espírito, acostumado desde há muito tempo a viver e a espraiar-se no clima da Igreja, cansa-se dessa tutela – que, aliás, não soube adaptar-se às condições novas do tempo – e pouco a pouco vemos por terra os princípios sobre os quais os mestres da grande época tinham firmado as suas obras. E vemos então, aparecer verdadeiros filósofos e teológicos, que são o engodo para as próximas rebeliões. Por fim, os acontecimentos contribuem singularmente para acentuar esse desequilíbrio: pestes, guerras, ruínas e devastações, tudo quanto é suficiente para que se abale a sensibilidade, juntamente com a consciência e a inteligência. Nesse declive fatal, por onde desliza o Homem das Catedrais e das Cruzadas, nenhuma força o pode deter.
Estranha época é essa em que se realiza a marcha para o abismo! O sinal mais decisivo do seu profundo desequilibro é a falta evidente de unidade anterior que ali se revela. É tudo contraste e contradição. Esse tempo de grandes chacinas é também dos arroubos místicos: por toda parte se respira o odor misturado de sangue e rosas. É o tempo das danças macabras e das esquisitas delicadezas das miniaturas, de processos de feitiçaria e da imitação. A sede do prazer anda a par com gosto pelas penitências excessivas, e aos mesmos homens que vemos entregues às violências selvagens. É uma época de febre, uma época mórbida, em que os mais belos impulsos espirituais degeneram facilmente em neurose, e que sob o golpe das emoções fortes, o homem, mesmo cristão parece vacilar.
( Do livro ,A Reforma Protestante - Daniel-Rops -Livraria Martins Editora-1962)

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